sábado, 1 de fevereiro de 2014

A mitologia de cada um

 Um jornalista novaiorquino passou tempos no oriente, documentava para as pessoas de cá,
a cultura dos povos de lá, dessa outra metade de nossa casa, dividida ainda assim em Oriente e Ocidente.
 Um dia, já não se podendo, perguntou a um monge num templo japonês:
 - Observei vários templos aqui, passando por China e Índia, Coréia, e realmente não consigo
captar a ideologia nem a teologia de vocês.
 Ao que, olhando pra dentro algum tempo, o monge respondeu:
 - De fato, nós não temos ideologia nem teologia, nós dançamos.
 Moral da história: o que te faz dançar? O que o religa ao todo?
 São os dogmas de uma religião, já pensada e moldada para que nada mude? Os desígnios já foram lançados, não se preocupe, apenas tenha fé.
 São as leis do mercado, já pensado e moldado para que sempre mude? Sempre mude a
aparência, o modelo; quantos não são os alienados e escravizados, em plena revolução digital?
 São os dias em família, entre amigos? sempre uma oportunidade para experimentarmos a
eternidade, aqui, na Terra.
 São as folgas, as férias, os domingos, dias de maior encontro consigo? Será por isso, alguns se
entediem em domingos, e outros não saibam o que fazer com 30 dias de férias?

 Com o Tripalium, romanos se evisceraram de prazer ao supliciar escravos e desafetos, e desse
instrumento tão sugestivo - veja como são as Línguas - chamamos, numa ironia, num chiste, o que
fazemos para nosso sustento, de trabalho.
 Neste ponto do texto, penso que precisamos de um novo mito, uma nova palavra.
 Pois há aquele tipo de atividade à qual nos entregamos de coração, sendo assim, sentimos
prazer e angústia em sua feitura, aprendemos continuamente e ainda passamos a outros a “boa
nova”, pois a harmonia com o todo é um sintoma de felicidade, dançamos a vida.
 O sociólogo do trabalho, Domenico de Masi tentou uma expressão, chamou-a “ócio-criativo”,
nada mal, como ideia conceitual está ótima, já que o negócio é a negação do ócio. Porém, sendo
mitologia nascente, o pessoal do marketing não aprovou os dois termos juntos, não “vai pegar”,
disseram.
 Mas como uma mitologia, coletiva e espontaneamente se cria, aguardamos ansiosos a criação
de milagrosa PALAVRA.

Por: Rodrigo Constantino Mariano
Formação: Administração (UEL: Univ. Est. de Londrina); História (UENP: Univ. Est. do Norte do Paraná)

4 comentários:

  1. Primeiro quero agradecer a presença de Rodrigo aqui na evolução. O tema mitologia nos faz viajar, não apenas na história, mas em nosso interior, a mitologia está em nós. A princípio, sendo sincero, tive de ler outras vezes, um texto incomum, mas que aos poucos nos mostra que as vezes não compreendemos algo tão especial. Parabéns.

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  2. De Rodrigo pra Rodrigo, agradeço as palavras... sim, é um texto pretensioso, adoraria ser literatura rs... é isso, a mitologia está em nós, guiando, ajudando nessa imensa confusão que é o mundo, valeu Xará!

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  3. Parabéns, Rodrigo, pela riqueza de seu texto!
    Há tempos me interesso por etimologia e uma das palavras mais curiosas, na minha opinião, é justamente "trabalho".
    Antes um instrumento de tortura, hoje a significação do mercado e motor que move a economia mundial. Acredito que em algum ponto da história consigamos resignificar seu sentido, enriquecendo o que ele representa - e, acredite, esta mudança acontecerá primeiro em nós! Como vc aborda em seu próprio texto, assim que conseguirmos conectar aquilo que nos faz dançar com as atividades que precisamos desenvolver (e isto é assunto para um outro post, hein!!!), compreenderemos então o que nos move e este impulso ganhará um nome que nos fará compreender o quanto rico é colaborar com o todo. Abraços!

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  4. Obrigado Vivian, fico grato sempre em saber que mais e mais pessoas estão repensando e contestando as "verdades hegemônicas" existentes, muitas delas criadas em torno do trabalho e da alienação necessária para que o sistema vigente não seja percebido. A história e o conhecimento dos mitos e etimologias, podem abrir nossos olhos... abraços

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